quinta-feira, 4 de novembro de 2010

O que fazer quando se está com raiva? Pelo monje budista Thich Nhat Hanh

Quando menos esperamos a raiva pode nos subjugar. Nossa mente se estreita, nossa paciência vai embora e o que pensamos ser a causa da nossa raiva é atacada por pensamentos, palavras ou até ações. Muitos hormônios nocivos são lançados na nossa corrente sanguínea , nossos batimentos cardíacos sobem e perdemos temporariamente a lucidez. A beleza do mundo some e nossa mente passa a andar em círculos, presa, sem liberdade. O que fazer quando isso acontece?

Ele nos ensina que o modo mais sábio é reconhecê-la, permitir que exista, e abraçá-la ternamente. Nunca reprimi-la. Você a abraça ternamente com a energia de plena atenção. O Buda recomendou enquanto estivermos bravos nós não digamos ou façamos qualquer coisa, porque isso é perigoso. Após abraçar a raiva é muito importante praticar o olhar em profundidade nas raízes de nossa raiva.

Pergunta: Thay, o que você faz quando está bravo?

Thay: Quando eu estou bravo, me volto para minha respiração. Eu inspiro, e expiro em plena atenção. Sei que raiva está em mim, e que eu não deveria dizer nem fazer nada naquele momento porque sei que fazer ou dizer qualquer coisa quando estiver bravo é muito perigoso. Me abstenho de agir e falar porque posso causar muito dano a mim e à outra pessoa.
Eu não creio que para cultivar amor e compaixão você tenha que suprimir sua raiva. Eu não acredito nisso. Não penso que tenhamos que suprimir nossa raiva absolutamente. Acredito que nós temos que reconhecer nossa raiva, permitir que ela exista, não suprimi-la e aprender a abraçá-la. Quando seu bebê chora, você nunca quer reprimir seu bebê. Seu bebê chora porque sofre. O que você deveria fazer é apanhá-lo e segurá-lo muito afetuosamente em seus braços. Isso é exatamente o que eu recomendo fazer quando a raiva estiver presente.

Raiva é um bloco de energia em mim, mas a prática é para eu convidar que um outro tipo de energia surja de forma que eu possa abraçar minha raiva ternamente. A primeira energia é negativa, a segunda energia é positiva. A primeira energia é raiva, e o segundo tipo de energia é a plena consciência: plena consciência da respiração e plena consciência da raiva, abraçando a sua raiva com a plena consciência. Assim você permite que sua raiva exista, reconhecendo isto como existindo em você, não querendo lutar contra ela. Você reconhece isto. Tem o direito de estar presente. O bebê tem o direito de chorar. Mas você não deveria deixar sua raiva o subjugar ou estar sozinha em você. Assim você sofreria muito, e poderia fazer coisas que causariam muito dano. Poderia dizer coisas que danificariam a relação entre você e outra pessoa. É por isso que o modo mais sábio é reconhecê-la, permitir que exista, e abraçá-la ternamente: "Oh, minha querida raiva, eu estou aqui para você. Eu cuidarei de você. O que está errado?” Você olha profundamente, prestando atenção a sua raiva, e assim não a está reprimindo.

Na psicoterapia, pessoas nos aconselham tocar nossa raiva, permitir que nossa raiva exista, reconhecer nossa raiva. Mas a pergunta é: quem tomará cuidado da raiva, quem reconhecerá a raiva, quem permitirá à raiva existir? Quem é o agente que faz o trabalho de tomar cuidado, de reconhecer? Nos ensinamentos do Buda está muito claro, que o agente que está cuidando da raiva, reconhecendo e abraçando é um tipo de energia que nós chamamos de energia de plena atenção. Quando você estiver bravo, tem que praticar a plena atenção da raiva. Plena atenção da raiva significa estar atento à raiva que está em você como uma energia, reconhecê-la, permiti-la existir. Você a abraça ternamente com a energia de plena atenção. O melhor modo para fazer isso é com a respiração atenta, ou o andar atento. Normalmente quando nós ficamos bravos não fazemos isso. Nós prestamos mais atenção à pessoa que pensamos ser a causa de nossa raiva. Mas o Buda nos aconselha voltar e cuidar bem de nossa raiva.

Quando sua casa estiver em chamas, a coisa mais importante para você para fazer é voltar para sua casa e tentar apagar o fogo. A coisa mais importante não é correr atrás da pessoa que você acredita que seja o incendiário. Isso é o que o Buda nos recomendou, ir para a casa interior e cuidar do fogo que queima lá dentro. É por isso que se durante o período de prática - de retornar, reconhecer, permitir existir, abraçar, olhar profundamente - você faz isso, então não terá tempo para dizer ou fazer qualquer outra coisa. O Buda recomendou que nós não digamos ou façamos qualquer coisa enquanto estivermos bravos, porque isso é perigoso. Retorne e tome cuidado.

Sobre Thich Nhat Hanh

Monge budista vietinamita, poeta e ativista dos direitos humanos. É o autor de mais de 60 livros. No ano de l967, devido ao seu imenso esforço e pregação sem violência, pela reconciliação entre o Vietnam do Norte e o do Sul, ele foi indicado ao Prêmio Nobel da Paz por Martin Luther King, Jr.

Em 1969, Thich Nhat Hanh chefiou a Delegação Budista Vietnamita da Paz na Conferência de Paz em Paris e após a Assinatura do Acordo de Paz, quando tentou retornar ao país, não mais foi permitido seu ingresso no Vietnam, e até hoje ele vive em exílio na França.

Em 1982, tendo como colaboradora a monja Chân Không, sua colega de muitos anos, fundou Plum Village, uma comunidade budista para monges e monjas, situada próxima a cidade de Bordeaux, no sudeste da França, onde ensina a "Arte de Viver em Plena Consciência". Em seus retiros participam a cada ano milhares de pessoas, procedentes de todas as partes do mundo. É autor de inúmeros livros sobre meditação, cura e transformação, e também inúmeros poemas e dirige retiros em vários lugares do mundo. Thay, como seus estudantes carinhosamente o chamam, continua a ensinar budismo engajado, responsabilidade social e dissolução da violência através da prática do viver consciente.

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